Os estudos clínicos multicêntricos, ou seja, aqueles conduzidos simultaneamente em mais de um centro de pesquisa, apresentam peculiaridades bastante interessantes, mas também desafiadoras para a pesquisa clínica no Brasil. Levando-se em conta a pluralidade do nosso país, com diferentes hábitos, costumes e culturas distribuídos em seus vários estados e regiões, o estudo multicêntrico é capaz de abranger uma maior parte dessa diversidade da população, aumentando a representatividade da amostra do estudo e, consequentemente, concedendo-lhe maior “poder”, já que seus resultados podem ser aplicáveis à população em geral. Além disso, sob o ponto de vista prático, facilita a captação de participantes de pesquisa, reduzindo o tempo do estudo.

Entretanto, na experiência adquirida com a prática da pesquisa clínica, temos observado duas questões que necessitam de reflexão no que tange a estudos multicêntricos: o trâmite de diferentes apreciações éticas dos Comitês de Ética em Pesquisa (CEPs) institucionais de cada centro participante e a importância na escolha do centro coordenador.

O processo de aprovação ética de um estudo multicêntrico tem início com a submissão do dossiê regulatório do estudo ao CEP do centro coordenador. Após a aprovação por parte deste CEP, denominado CEP coordenador (e também da CONEP, caso necessário), os demais centros participantes devem submeter o dossiê regulatório do estudo a seus respectivos CEPs institucionais.

Levando-se em conta a necessidade de manter a equivalência dos documentos do estudo para todos os centros participantes, quando são solicitadas alterações na documentação por parte dos diferentes CEPs, temos então uma complexa situação a ser administrada, pois estas alterações teriam que ser encaminhadas aos demais CEPs para apreciação (inclusive do CEP coordenador e dos CEPs que eventualmente já aprovaram o estudo). Aplicando esta situação a uma escala de dezenas de centros de pesquisa (o que muitas vezes corresponde à realidade), abre-se precedente a um emaranhado e infindável trâmite regulatório.

Especialistas ligados a esta seara já expressaram opiniões favoráveis a um sistema regulatório em que, no caso de estudos multicêntricos, o projeto de pesquisa deveria ser aprovado pelo CEP coordenador, cabendo aos demais CEPs institucionais a opção de, conforme sua apreciação ética, aderir ou não àquele projeto, não sendo permitidas novas alterações.

Seja para tornar possível este processo regulatório utópico, seja para evitar alterações na documentação e emendas desnecessárias no processo atual, há que se levar em conta a grande importância da escolha do centro e CEP coordenadores, cabendo ao patrocinador esta importante atribuição.

O centro coordenador é o responsável pela coleta e organização das informações provenientes de todos os demais centros envolvidos no estudo clínico e, para tal, além de uma equipe especializada, é necessário o estabelecimento de uma comunicação constante com os demais centros. Outro aspecto a ser observado se refere ao CEP desta instituição. O CEP coordenador não necessita apenas das qualificações inerentes a um Comitê de Ética em Pesquisa. É ele o grande “carro-chefe” da aprovação ética da pesquisa e, tendo em vista tal responsabilidade, é desejável que sua avaliação seja criteriosa e consistente o bastante a fim de evitar outras pendências por parte dos demais CEPs, poupando atraso nos prazos regulatórios, inúmeras emendas geradas, dificuldades na manutenção da equivalência da documentação, além de outros percalços no decorrer na pesquisa.

Isto posto, é notável que a incumbência de coordenar um estudo multicêntrico acarreta uma grande responsabilidade tanto para o centro quanto para o CEP institucional. Assim, a definição por parte do patrocinador deve ser baseada na qualificação de ambos, garantindo uma pesquisa de qualidade e sem maiores entraves.